Apóstolo Pedro o Autoconfiante - Sem o Espírito Santo não há obra de Deus - VI
Lc 22.31-34
Somos constantemente tentados em buscar méritos dentro de nós, em confiar em nossos talentos e experiências,nas reservas financeiras, na estabilidade do emprego que gera acomodação, na formação acadêmica, até na
capacidade humana de uma forma geral, para executar a obra de Deus.
Quando a crise se instaura, a pressão espiritual se torna crítica e todos os
talentos não mais respondem satisfatoriamente, numa relação direta com
crescimento, lucro e badalação triunfalista, invariavelmente as reações são de
duas formas: ou passa-se a buscar então a Deus através da oração e jejum,
pedindo socorro para um resgate com restauração imediata, ou se debanda para o
outro lado, sendo instrumento de Satanás da forma mais terrível, com uma
fachada “gospel”, sendo consciente dessa realidade ou não.
O que temos no texto
proposto é a reação de um discípulo de destaque, escolhido como um dos doze
apóstolos. Uma pessoa privilegiadíssima em virtude de ter caminhado por
aproximadamente três anos com o Mestre dos mestres, Senhor dos senhores e Rei
dos reis.
Pedro também recebeu
a mais profunda teologia, a mais perfeita soteriologia, a mais explicita e
profunda cristologia, o próprio Cristo pessoalmente, vivendo e falando acerca
de si mesmo. Conviveu com a Perfeição em forma de gente, com o Verbo que se fez
carne.
Ele experimentou o
sobrenatural de uma forma maravilhosa: andou sobre as águas (Mt.14.29); estava
no monte da transfiguração quando apareceram glorificados Moisés e Elias juntos
de Jesus (Mt.17.1 - 4). Viu vários milagres, foi usado, antes da ascensão do
Senhor, expulsando demônios e curando pessoas.
Não é fácil para um crente
com o currículo de Pedro manter a humildade e a total dependência para com
Deus, buscando em seu Espírito ajuda constante para a obra proposta.
O Mestre já sabia que
estava na eminência de sua prisão. Naturalmente havia uma preocupação com os
discípulos. Com o que iria acontecer, como eles iriam reagir ao desenrolar dos
acontecimentos. Antes de falar diretamente com Pedro Ele exortou os discípulos
à humildade. Devido o surgimento de uma discussão de quem seria o maior entre
eles, Jesus declarou: “Os reis das nações dominam sobre elas; e os que
exercem autoridade sobre elas são chamados benfeitores. Mas, vocês não serão
assim. Ao contrário, o maior entre vocês deverá ser como o mais jovem, e aquele
que governa, como o que serve. Pois quem é maior: o que está à mesa, ou o que
serve? Não é o que está à mesa? Mas eu estou entre vocês como quem serve. Vocês
são os que têm permanecido ao meu lado durante as minhas provações. E eu lhes
designo um Reino, assim como meu Pai o designou a mim, para que vocês possam
comer e beber à minha mesa no meu Reino e sentar-se em tronos, julgando as doze
tribos de Israel” (Mt.22.25-30).
O maior é o menor, o maior é aquele
que serve.
Complicada de se
colocar em prática é a humildade, na perspectiva humana decaída. Saber caminhar
sem nenhum sentimento de orgulho e independência quando o “sucesso” vem. O
isolamento, em muitos casos passa a ser inevitável. “Eu não caibo mais em
qualquer lugar”, afirma com o ego inflado, o “bem sucedido". O que Pedro
vivia era fabuloso demais, sublime demais para uma pessoa com a natureza
decaída.
Jesus alerta
confrontando a Pedro: "Simão, Simão, Satanás pediu vocês para
peneirá-los como trigo. Mas eu orei por você, para que a sua fé não desfaleça.
E quando você se converter, fortaleça os seus irmãos” Jesus falou na frente
dos demais discípulos que Pedro precisava se converter. Satanás pediu a Deus
para peneirar os discípulos como um todo, inclusive Pedro, mas Jesus, na frente
de todos alerta a Pedro acerca da necessidade da genuína conversão para ser
protegido dos ataques malignos e poder ajudar os demais discípulos.
Pedro não aceitou de
forma alguma aquela confrontação, denunciando a sua vulnerabilidade e reagiu
afirmando está pronto para ir com o Senhor para a prisão e para a morte. O
Mestre ignorando o que Pedro havia falado disse-lhe a realidade futura próxima:
negação do compromisso com O Mestre e por três vezes antes que o galo cantasse.
É complicado para
alguém já estabelecido como Pedro, uma pessoa com fortes indicativos de
liderança até para com os demais apóstolos, aceitar aquele descredenciamento. O
Senhor estava promovendo um tratamento de choque imprescindível para “quebrar”
a autoconfiança e o orgulho já evidente e que dominava, de uma forma
comprometedora, a Pedro.
Ele estava
estabelecido e seguro, afinal de contas o Messias era o seu líder imediato,
tudo caminhava bem, apesar da oposição forte do Sinédrio.
Pedro acompanhou o
Mestre em vários momentos críticos em que tentaram apedreja-lo e prendê-lo e
nada aconteceu. Estava tudo sobre controle. Pedro podia sonhar, idealizar uma
nação judaica livre. Finalmente estava próxima a instauração do Reino
Messiânico.
Não é incomum
fazermos planos, idealizarmos uma porção de estratégias convenientes aos nossos
interesses e colocarmos como sendo projeto de Deus para as nossas vidas e para
os demais que estão ao nosso redor.
Quando Pedro afirmou
está pronto para morrer por Jesus ele não quis fazer média, ele não mentiu.
Pedro estava pronto para morre pelo Jesus que ele concebia, segundo o que
idealizava como seria o Messias. A prova cabal disso é refletida em sua reação
inicial quando chegou à guarda do templo no monte das Oliveiras para prender
Jesus. Pedro pegou uma espada e decepou a orelha de um servo do sumo sacerdote
(Jo.18.10).
Ele estava pronto
para morrer por um messias político que mobilizasse a população e derrubasse o
império romano ocupando o trono de Israel. O Cristo que Pedro enxergava não era
o mesmo Cristo que estava a caminho da cruz.
O Deus que muito
enxergam e se relacionam nem sempre corresponde com o Deus verdadeiro.
Idealizam-se projetos das mais várias tendências para Deus sem, contudo,
consulta-lo para saber se o projeto é o segundo a Sua vontade.
Nem sempre idealizar estratégias, mesmo de evangelismo ou missões para Deus, é
segundo a vontade dEle. O projeto de Deus vem de Deus para o homem e não do
homem para Deus. Precisamos consultá-lo para saber qual a Sua vontade.
Após aquela impulsiva
e agressiva reação Jesus se dirige a Pedro dizendo: "Guarde a espada!
Acaso não haverei de beber o cálice que o Pai me deu?" (Jo.18.11) revelando
a Pedro que havia um propósito de Deus naquele momento de prisão e que todos os
propósitos iriam serem cumpridos.
Na versão atribuída a
Mateus a declaração é mais contundente "Guarde a espada! Pois todos os
que empunham a espada, pela espada morrerão. Você acha que eu não posso pedir a
meu Pai, e ele não colocaria imediatamente à minha disposição mais de doze
legiões de anjos? Como então se cumpririam as Escrituras que dizem que as
coisas deveriam acontecer desta forma?" (Mt.26.52).
A grande
questão da proposta não é o poder para execução da vontade de Deus, mas a
forma: as armas que seriam utilizadas. Uma forma inédita, absurdamente
diferente e aparentemente sem nexo e contraditória: a cruz. A arma principal
passou a ser o amor, a não violência, o dar a outra face, o amar o inimigo.
Pedro não entendia
mais nada. Desabou todos os referenciais. A expectativa triunfalista de governo
atrelado à tomada de poder desmoronou. Os referenciais, os projetos de Pedro
para o Messias não corresponderam. "E agora?!
Para aonde irei? o que farei? Que historia é essa? Preciso rever tudo". Provavelmente pensou Pedro
atordoado, tonto, desnorteado.
É preciso o ideal humano desmoronar
para o ideal divino se estabelecer
Muitos servos de Deus
passaram e passam por esse processo. São pessoas bem intencionadas e sinceras
para com Ele, mas não aprenderam ou não quiseram entregar seus projetos e
sonhos ao Senhor. Desiludidas, em boa parte, perderam o rumo, adoeceram na
alma, ou se desviaram do alvo de tal forma que, apesar da sinceridade, estão
atrapalhando a obra de Deus. Naquela perspectiva de, na melhor das intenções,
legitimarem a morte de Jesus com os perfumes e óleos, conforme analise das
mulheres indo ao tumulo, comentado no outro texto.
Quem se recuperar
de uma grande queda tem muito mais chance de ser intimo de Deus.
O Pedro que estava,
antes da prisão de Jesus pronto para morrer por Ele, não sabia mais de nada. Os
seus valores e referenciais estavam em cheque. Nada era seguro naquele momento.
Os fatos se sucediam em velocidade. Não dava para raciocinar direito, tudo
estava meio confuso.
Quando perdemos os fatores que nos trazem estabilidade ficamos vulneráveis.
Pedro estava vulnerável, frágil e amedrontado.
Perguntaram a Pedro,
uma vez, duas vezes, três vezes se ele era um deles, um dos seguidores de
Jesus. Disseram a ele que só podia ser já que seu modo de fala era similar aos
galileus que andavam com Jesus. Pedro negou uma vez, negou segunda vez e,
segundo o evangelho escrito por Mateus ele negou a Jesus por ultimo amaldiçoando
e jurando afirmando: "Não conheço esse homem!” quando alguém
afirmou que certamente ele era um deles (do grupo de Jesus).
O galo cantou. Pedro lembrou-se de sua promessa ao Mestre e lembrou que
Jesus profetizou a negação atrelada ao o canto do galo. Ele chorou amargamente
(Mt.26.73-75).
Criar expectativas de si mesmo, baseado em autoconfiança, para com Deus pode
ser frustrante.
Muitos que se
frustram na obra de Deus tendem a desistir e voltar a fazer as coisas que
praticavam antes. Pedro e outros discípulos voltaram a pescar (Jo.21.3), outros
voltam a serem depressivos, outros a beber, alguns a pratica de sexo ilícito...
Pedro muito
provavelmente se autodemitiu, desistiu de servir a Cristo. A tendência de
querermos decidir sozinhos se estamos ou não aptos para fazer a obra de Deus é
lamentavelmente frequente.
Um anjo que apareceu às
mulheres, numa clara conspiração de resgate e valorização divina às mulheres,
preferindo-as como pioneiras no anúncio da vitória de Cristo sobre a morte,
pedem para avisar aos discípulos e, de forma personalizada a Pedro acerca
da ressurreição do Senhor (Mc 16.7).
O Mestre, já
ressuscitado a beira mar, vai ao encontro dos discípulos pescadores e os
orienta para jogarem a rede do lado direito do barco. Eles não reconheceram
quem falava. Os discípulos passaram a noite toda tentando pescar alguma coisa,
mas nada encontraram, podia ser que eles não soubessem como era seguir a Jesus,
mas pescadores eles eram, mas, nada de peixes.
Quando alguém tem um chamado missionário e está fora do propósito de Deus, nem o que ele domina com competência profissional, haverá rendimento produtivo satisfatório, até mesmo o trivial será mal executado. Não há prosperidade.
Em obediência aquele
homem que com segurança os orientava, lançaram a rede. Depois a mesma quase se
arrebenta, tamanha foi a quantidade de peixes (Jo.21.1-14).
Não se faz nada com competência, quando se tem um chamado para servir a Deus,
se não for com a orientação do Espírito Santo.
Nas linhas
abaixo refletiremos sobre a sequência do encontro à parte com Pedro, no
momento em que Jesus passa a interroga-lo. Imaginemos o que se passava, naquele
momento, na mente do apostolo:
Após a refeição Jesus
passa a indagar a Pedro: “Simão, filho de
João, você me ama mais do que estes?” Disse ele: "Sim, Senhor, tu sabes
que te amo". Pedro deve ter pensado:
- Pronto, agora será a hora que Ele vai me falar as verdade que tenho de
ouvir. E com justiça. Talvez vá somente comunicar o que já sei: a minha
incapacidade de ser seu seguidor e me orientar a continuar pescando.
Jesus usou o verbo
agapaõ (amar desinteressadamente) e Pedro respondeu com phileõ (amor fraterno,
menor em intensidade e compromisso). Presumo que Pedro estava mais comedido,
devia ainda pensar:
- Eu disse que estava pronto para morrer por Ele e o neguei várias vezes,
agora eu vou ficar é quietinho por aqui. Eu não sei é mais de nada.
Disse Jesus:
- Cuide dos meus cordeiros
Pedro pensou:
- Como pode, ele está me readmitindo! Eu nem respondi a altura, eu falei de
um compromisso menor!?
Novamente Jesus disse:
- Simão, filho de João, você me ama?
De novo usou agapaõ. Jesus pergunta pela segunda vez, Pedro deve ter reagido
em seu intimo assim :
- parece que a primeira resposta não tinha valido. Será que Ele estava só me
testando?
Pedro respondeu então:
- Sim, Senhor, tu sabes que te amo.
Pedro insistiu
em responder com phileõ, ele não estava mais em condição de ousar, a modéstia
estava fazendo parte de sua estrutura.
Disse Jesus:
- Pastoreie as minhas ovelhas".
A segunda vez que o
Mestre falou da sua readmissão pode ter deixado em Pedro uma impressão de
aprovação, de que o ocorrido na verdade não foi tão grave. Na verdade ele
poderia ‘ser o bom’ que antes pensava que era.
Pela terceira vez, Ele lhe
disse:
- Simão, filho de João, você me ama?
Dessa vez o Senhor usou o mesmo verbo que Pedro utilizou para
responder as duas primeiras perguntas, o phileõ. Isso, provavelmente confrontou
o já combalido discípulo. E agora? A
dúvida, o medo, a vulnerabilidade devem ter voltado com toda intensidade.
Pedro ficou magoado por Jesus lhe ter
perguntado pela terceira vez "Você me ama?" E lhe disse:
- Senhor, tu sabes todas as coisas e
sabes que te amo.
Pedro poderia ter acrescentado
assim: Tu sabes que eu não sou muito, conheces o meu coração, conheces o meu
passado, o meu presente, sabe de tudo, sabe o meu limite, das minhas
inconstâncias, sabe que, pelo menos te amar como amigo é possível.
Disse-lhe Jesus
- “Cuide das minhas ovelhas Digo-lhe a
verdade: Quando você era mais jovem, vestia-se e ia para onde queria; mas
quando for velho, estenderá as mãos e outra pessoa o vestirá e o levará para
onde você não deseja ir”.
João afirma que Jesus
estava dizendo a forma com que Pedro iria morrer por amor a Ele. Como se
dissesse: Só os nascidos de novo, cheios do Espírito Santo e escolhidos por
Deus podem ter esse privilégio de ser mártir. Não é de qualquer forma de
qualquer jeito que se sofre por amor ao Evangelho. Só os escolhidos e
capacitados pelo Pai.
A tradição histórica
da igreja afirma que Pedro foi crucificado, em sua velhice, de cabeça para
baixo, por ter alegado não ser digno de morrer da mesma forma que o Senhor.
Deus usa a nossa
formação teológica, usa a nossa experiência, usa os nossos talentos naturais, a
nossa inteligência, mas, tudo isso sem o controle do Espírito não adianta na
obra de Deus.
2 Comentários:
Muito bom. Bem melhor. É isso mesmo! Vai em frente!!! Acho que finalmente os discípulos aprenderam a lição; se não, não estaríamos nós aqui, séculos mais tarde. Eles teriam concentrado todo poder neles mesmo, não teria passado as verdades da Palavra para outros e teriam destruido muitas pessoas e a obra de Deus no mundo.
Deus abençoe
Abraço
Barbara
Boa explicacao!
Postar um comentário
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial